Bento tinha 15 dias quando fui pela primeira vez à
pediatra. Estava feliz e molenga exibindo meu rebento pelas ruas. Na consulta,
ele se manteve quieto, exceto no momento em que ela tirou a sua roupa e tocou
nas suas bolas. Bolinhas. Ele sempre detestou essa burocracia toda que envolve
roupas. Houve uma fase (verão, obviamente)
que eu evitava trocar as roupas dele, só para não contrariá-lo. Para sair
do consultório fiquei 45 minutos na sala de espera dando de mamar para
acalmá-lo. O que aprendi com isso? “Não
se mexe com quem tá quieto.” Noutras palavras, Bento feliz, eu feliz. Bento
quieto, eu imóvel.
Na volta para casa, ele veio no canguru dormindo (graças ao Senhor). Entrei na minha vila
e cruzei com duas vizinhas, irmãs. Uma delas, mãe de 3 (haja coragem), me perguntou:
- Já teve vontade de jogar pela janela?
Eu ri e respondi:
- Ainda não! - eu só tinha 15 dias na condição
materna, no momento com 8 meses, faz todo sentido.
-Vai ter! E é normal. Só não é normal se você
jogar. Essa é a maternidade real. Você vai sentir raiva dele. Anota, pois isso
não está nos livros.
Não está mesmo.
Ó bebê santo, fofo e indefeso! Sim, eles são isso
tudo. Isso “tudo” é o que salva. Sua
fofura e a ocitocina que foi descarregada no meu corpo durante o meu parto são
as armas (do bem) que salvam Bento
dos meus momentos de fúria.
Amiga mãe e gestante, eu não senti, e sinto com
frequência, raiva, eu senti, sinto e sentirei (inevitavelmente) fúria! Fú-ria! Sabe pelo quê? Por coisas
aparentemente idiotas, mas que ilustram o lado não muito cor de rosa da
maternidade.
Tipo, dormir. Depois de
passar 8 meses dormindo picado, você quer ouvir a Sandy cantando “Imortal não morre no final” mas não
quer ouvir a voz do seu filho te chamando às 2am.
Outra coisa que vai
te irritar, surtos de choro quando você está tentando uma interação social.
Saio com meu filho para um almoço com amigos e ele resolve ficar enjoadinho,
reclamão. Você pensa, normal né? Que tipo de criança quer ficar parada? Só as
doentes ou as que foram embebidas num caldeirão de maconha ao nascer. Não foi o
meu caso e eu não estou reclamando, mas… Me irrita, e assumo, me ressinto pela perda da minha liberdade.
Conheço mães como eu e isso me alivia. Assumimos os pesares da maternidade sem
nos abster de nenhum cuidado com nossos filhos (vai ter vontade de jogar, mas não coragem, lembra?).
Num livro muito divertido sobre a história de
uma mãe que tinha um bebê pesado como o meu, ela cria a seguinte imagem: ser
mãe é como estar dentro de uma piscina de ondas 24horas. É exaustivo.
Vejo na mídia e nos livros, discrições do paraíso
em torno da maternidade. “Ser mãe é
padecer no paraíso”- a frase soa bonitinho, comportado. Quer
saber mesmo o que é ser mãe? Ser mãe é se fuder no
paraíso. Você experimenta o maior amor que poderia sentir, pelo ser
aparentemente mais adorável que poderia existir e, por conta disso, tem que
suportar todas as dificuldades para cria-lo bem. Vai ter que dar espaço
para ele exibir sua personalidade e o que vai te restar é aceitação.
Outra coisa que tinham que ensinar pra gente (se tentaram me ensinar, matei essa
aula) é como ter, fazer brotar, paciência. Já me peguei com o Bento
chorando, segurando sua mão e emanando o ohn. Ele parou de chorar, não porque
se acalmou com o mantra, mas porque achou esquisitíssimo sua mãe de olhos
fechados repetindo a mesma coisa. Acho que no fundo ele sabia: “é melhor eu parar, ela está no limite, vai
me colocar na cestinha.” Existe prótese de paciência? Eu compraria.
Quando estou na piscina de ondas por muito tempo,
direto com ele sem alguém para me render, entro num estado irritável
muito grande. Levo ele para passear e me deparo com mães felizes na
pracinha. Nada me faz mais culpada e raivosa do que mães felizes na
pracinha. Começa a conversa de Alice no país da maternidade. Meu
impulso é falar “Tá bom, vamos falar
a verdade, tem horas que dá vontade de bater a porta e isolar a chave, num
é?”
Não está nos livros, nem na internet, nem na conversa das mães da
pracinha, o lado negro da maternidade. Você vai querer tomar um porre. Vai
querer passar o dia na Prainha, e não duas horas do melhor sol no Ipa bebê
cercada de crianças que jogam areia em você. Vai querer ouvir Florence and The
Machine no carro e não o novo cd do Palavra Cantada. Vamos! Assuma!
A única coisa que essas falsas expectativas fazem é
gerar culpa. Saio da pracinha me sentindo odiável e com pena do Bento por me
ter como mãe. Também não está nos livros, culpa é inerente à
maternidade, andam de mãos dadas. Sua motivação é que você quer ser a
melhoooorrr mãe do muuundo. O que não sai como o esperado,
vai para sua caixinha de culpa. O problema é que culpada, você
procura ser melhooorrr ainnnddaaaa, enquanto deveria ser o melhor possível,
pois você também é protagonista nessa história.
Talvez, eu me sinta culpada por essas palavras (ou seria um desabafo?), mas vou me
prender ao que minha vizinha me disse. Eu não joguei pela janela.